sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

ARTIGO DO DIA - LAU SIQUEIRA: CULTURA, MERCADO E REALIDADE REGIONAL

LAU SIQUEIRA - Presidente da FUNESC - Espaço Cultural













 
Considero o francês Edgar Morin um dos mais lúcidos pensadores do mundo contemporâneo. O que é pensado sobre a Europa do século XX, serve para a realidade do Cariri, do Curimataú, do Seridó, do Brejo ou qualquer região da Paraíba neste começo do século XXI. A homogeneização, a padronização, a degradação e o extravio das diversidades culturais, pelo menos, se assemelham. Não é de outra coisa que Morin está falando no livro “Rumo ao Abismo? – Ensaio sobre o destino da humanidade” se não da chegada dos paredões e da mercantilização da cultura nos terrenos sagrados da diversidade e da identidade cultural nordestina, nos sítios onde ainda resistem os Bois de Reis, os Reisados e as bandas  de Pífano. Claro que não é só na Paraíba. Em outras regiões também é assim. Do município de Cruzeiro do Sul, no Acre até Uruguaiana, no extremo sul do RS. Somos regidos pela globalização.


Movida pelo jabá, a mídia cumpre um trágico papel neste cenário. George Orwell já falava disso no livro 1984. Segundo Orwell, nesse tempo de modernidades diluídas que vivemos, as músicas seriam feitas por computador. Se não é isso que acontece hoje, é quase isso. Mas, não é apenas na música, onde o time do “lek lek lek” vai goleando o time do “tengo lengo tengo”. Também o fenômeno ocorre em outras áreas. Até mesmo na fabricação de instrumentos. Um certo luthier de Cajazeiras não fabrica mais violinos, pois não há como competir com a produção  massificada do capitalismo selvagem made in  China.

As mazelas da mercantilização não são poucas. É onde mora a lógica do capital: o lucro como objeto do desejo. O pão e o circo em algumas demandas culturais devastadoras, enriquece ilicitamente bandidos simpáticos e sustenta os rebolados nas demandas sociais mais deprimentes. Como a erotização da infância, a degradação da imagem feminina e a homofobia, por exemplo. Algumas expressões musicais, sem dúvidas, muito antes de demarcar terreno no populismo cultural, avançam sobre processos de corrupção e aniquilamento das identidades regionais alijadas de qualquer disputa num mercado monopolista. Os Mestres da cultura tradicional brasileira correm o risco de desaparecimento em nome de um “folclore planetário”. Os focos de resistência em governos ditos progressistas começam a escorrer pelos dedos. Os mercados locais e regionais da cultura passaram a ser objeto de movimentos da sociedade e não mais de governos que optaram pelo popuaresco, desprezando uma geração inteira de criadores, pensadores e Mestres da Cultura. Seja nos pampas, no cerrado ou nos sertões. Enfim, o século XXI potencializa suas mazelas. Todavia, quando o cenário é de ameaças, o palco é da resistência.
Artigo publicado hoje no Jornal A União - Paraíba, João Pessoa.
              

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